quarta-feira, 15 de abril de 2009

O Chamado das Árvores


Jequitibá-rosa de Santa Rita do Passa Quatro


Você nunca mais olhará um bosque da mesma maneira depois de ler esta reportagem. Uma legião de seres vivos, compassivos, dotados de inteligência especial: é assim que a escritora canadense Dorothy Maclean define as árvores. Em sua passagem pelo Brasil, ela encontrou um campo fértil para a defesa do verde e lançou um livro com as sementes da ecologia espiritual

A cearense Maria Roberta Macedo saiu para comprar balas com o sobrinho João Rafael, de 2 anos. No caminho, admiraram uma árvore e resolveram gastar os 2 reais do doce comprando uma muda de jambo. Plantaram no jardim da casa, em Juazeiro do Norte, e até hoje se divertem olhando a planta crescer junto com o menino. O mineiro Paulo de Souza e sua mulher costumam guardar as sementes das frutas que consomem e, quando viajam, fertilizam o caminho: "Vou dirigindo devagar pelo acostamento enquanto ela lança as sementes na terra. Assim, ajudamos os pássaros a realizar o milagre da vida", diz ele. Esses e muitos outros depoimentos estão registrados no site www.ummilhaodearvores.org.br, que convida gente de todos os cantos a salvar a Terra plantando árvores. Cerca de 100 mil pessoas já registraram plantios. Agora, essa campanha ganha um impulso internacional em parceria com o grupo Honrar La Tierra, da Colômbia, e também com o apoio das conferencistas Judy McAllister e Dorothy Maclean, da Fundação Findhorn, da Escócia.

Judy e Dorothy vieram ao Brasil para uma série de palestras e esta última lançou em português o livro O CHAMADO DAS ÁRVORES (ED. IRDIN). Desde os anos 60, ela faz da ecologia uma missão espiritual. "Somos todos um", acredita. "Não apenas uma família de seres humanos, mas uma família de seres do planeta. E a vida é essencialmente divina", diz Dorothy, que, mesmo com idade avançada - 88 anos -, faz em media dez viagens por ano alertando grandes platéias da Europa, Ásia, América Latina e dos Estados Unidos para o fato de que as árvores são a pele da Terra. "A humanidade tem se esquecido de que é parte da rede da vida. Muitos acham que a natureza é algo para ser usado apenas para a própria comodidade, sem merecer respeito nem gratidão. Cada um de nós deve transformar isso".

Além de plantar árvores novas, é preciso preservar as maduras, que têm grande capacidade de absorver gás carbônico e transformá-lo em oxigênio: "Com 15 ou 20 anos, uma árvore já consegue absorver 1 tonelada de CO2. Em casa, as plantas servem como filtros de poluição e ruído", diz Carlos Solano, arquiteto mineiro que encabeça a campanha Um Milhão de Árvores. Segundo a Organização das Nações Unidas, não existe qualidade de vida e redução de stress urbano sem, no mínimo, 16 metros quadrados de área verde por habitante. E uma conseqüência direta da falta de arborização é o aquecimento global.

Nem sempre dá para agir efetivamente impedindo que as temperaturas subam ou que cesse a devastação da Amazônia, mas cada um pode e deve fazer a sua parte. Um ótimo jeito de se apaixonar pela causa é visitar algumas das árvores centenárias espalhadas pelo Brasil. "Em São Paulo, há três figueiras gigantes e uma delas, uma frondosa senhora de mais de 100 anos, está no Parque do Ibirapuera. O Parque Trianon, em plena avenida Paulista, é um fragmento de mata nativa preservada e tem árvores de mais de 500 anos, como jatobás e jequitibás", conta Sandra Siciliano, paisagista, que há 25 anos estuda os aspectos simbólicos da flora brasileira. "No Parque Estadual de Vassununga, em Santa Rita do Passa Quatro, no interior de São Paulo, está um dos seres mais antigos do planeta: um jequitibá-rosa de 40 metros de altura e 3 de diâmetro, apelidado de o Patriarca. Estima-se que tenha mais de 3 mil anos, embora isso não esteja comprovado cientificamente." Segundo a especialista, uma das grandes gameleiras do país está no terreiro do Gantois, em Salvador, na Bahia; e outra viu nascer, à sua volta, a capital do Acre, Rio Branco. A árvore continua firme e é um ponto de encontro no centro da cidade, oferecendo sombra de mais 30 metros de diâmetro, uma bênção numa região tão quente.

E pensar que essas árvores gigantes e florestas inteiras surgiram de uma minúscula semente, que nós também podemos plantar.


PIONEIRA A ECOLOGIA ESPIRITUAL
Na década de 60, a educadora Dorothy Maclean e seus amigos Eillen e Peter Caddy já meditavam e mantinham uma forte conexão com uma espécie de divindade interior. Guiados por ela, os três deixaram seus empregos formais e viajaram a bordo de um trailler até o meio de uma área desértica, no norte da Escócia. O solo era árido, mas eles tinham como missão ficar ali e fazer um jardim. Trouxeram as plantas e se puseram a trabalhar na terra. Em pouco tempo, a área estava coberta de vegetação, flores e frutos. Assim nasceu a comunidade de Findhorn, a ecovila mais antiga do mundo, fundada há quase 50 anos. Hoje, é um centro de estudos de projetos de sustentabilidade e de práticas espirituais, pois, segundo os idealizadores, essas seriam duas faces indissociáveis da manutenção da vida. Foi lá que Dorothy, na época com 40 anos, começou a receber mensagens das árvores – tema desta entrevista que ela deu a CLAUDIA durante sua visita ao Brasil.

CLAUDIA: Como a senhora capta as mensagens da natureza?
Dorothy Maclean: Isso começou a acontecer depois de uns dez anos de prática meditativa, de sintonia com a minha divindade interior. Não ouço vozes nem tenho visões, é como se fosse uma idéia que me chega inteira, vinda do reino vegetal. Uma espécie de telepatia. Aí, tento traduzir esse insight em palavras fazendo anotações em um caderno de bolso. Em comum, seja na Suíça, seja na Argentina, todas as árvores pedem ajuda humana para continuar vivas e oferecem suas qualidades para manter a vida no planeta.

Acha que qualquer pessoa poderia começar a ouvir as árvores? Como?
Sim, a conexão vem quando somos amorosos e pacientes e reconhecemos sua inteligência. Na presença delas, mantenha a mente receptiva, faça uma conexão com Deus – ou com a força de vida que está em todas as coisas. Concentre-se nessa sabedoria, e a comunicação será possível.

Pode nos contar um recado que elas enviaram?
Claro, publiquei vários no meu livro. Por exemplo: “Todos aqueles que, por alguns instantes, param diante de nós e nos admiram são ajudados”.

Acredita que as árvores podem aliviar a depressão e o stress urbano?
Sim, mas é preciso estar perto delas. Passear num parque e descansar à sombra de uma árvore é revigorante. Ela nos lembra de ir mais devagar, de respirar, de sentir a natureza. Só isso já tem grande poder transformador. Além de oxigênio, ela nos oferece estabilidade e paz. É preciso agradecer pela beleza que ela traz – não só nos bosques e jardins mas também nas casas, nos objetos e móveis de madeira, nos livros, pois o papel vem das árvores.

É otimista quanto à luta pelo verde?
Sou, mas o problema é que muitas pessoas querem manter um estilo de vida que vai contra a sustentabilidade. Podemos fazer as mudanças necessárias, porém precisamos escolher fazê-las. Está em nossas mãos.

Existe diferença entre árvores velhas e jovens?
Uma planta jovem não pode realizar a mesma função das maduras. Apenas as árvores velhas são capazes de ancorar energias vitais muito profundas para alimentar a vida na Terra. Só as florestas podem nutrir o planeta nesse nível e por isso têm que ser preservadas.

Reportagem publicada na revista Claudia. Texto retirado do site: www.paganismo.org

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